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Mecanismo de Ação

Tal como os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) o paracetamol é capaz de inibir a síntese de prostaglandinas a partir do ácido araquidónico, por inibição da cicloxigenase (COX). Os efeitos desta inibição parecem ocorrer, contudo, essencialmente a nível do sistema nervoso central (SNC), resultando numa ação analgésica (possivelmente no hipotálamo) e antipirética (no centro regulador da temperatura, situado também no hipotálamo), enquanto que os efeitos periféricos são insignificantes. O paracetamol inibe as isoformas COX-1, COX-2 e COX-3. A COX-3 é uma variante da COX-1 recentemente descoberta localizada a nível cerebral, sugerindo-se ser a isoforma mais sensível a este fármaco e ter assim um papel importante no efeito do paracetamol, contudo a função desta cicloxigenase é ainda incerta.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

No entanto, o efeito do paracetamol parece ser diferente do efeito dos AINEs, uma vez que a sua atividade anti-inflamatória e antirreumática é desprezável. O paracetamol inibe a COX reduzindo o substrato necessário (radical ferro-protoporfirina IX) para a produção de um radical no resíduo de tirosina-358 da COX, a qual na ausência deste radical é incapaz de sintetizar Prostaglandina G2 (PGG2) a partir do ácido araquidónico. Hidroperóxidos como a PGG2 inibem o efeito do paracetamol, uma vez que aumentam a disponibilidade do radical ferro-protoporfirina IX. Em ambientes inflamatórios estamos perante elevados níveis deste hidroperóxido, suprimindo os efeitos do paracetamol, justificando assim a ausência de atividade anti-inflamatória e a observação de diferentes efeitos em diversos tecidos.

 

O paracetamol parece ser também um ativador das vias nocicetivas serotoninérgicas inibidoras descendentes. A administração de paracetamol com um antagonista do recetor da serotonina bloqueia completamente o efeito analgésico do paracetamol, sugerindo que este fármaco é capaz de provocar analgesia por ação nesta via.

 

O paracetamol pode ser também responsável por efeitos similares aos dos canabinóides, como euforia, relaxamento e tranquilidade. O paracetamol pode ser desacetilado a p-aminofenol, sendo depois conjugado com o ácido araquidónico por ação da ácido gordo amida hidrolase (fatty acid amide hydrolase - FAAH), originando N-araquidonoilfenolamina (AM404). Este metabolito ativo, tal como os canabinóides, possui atividade analgésica e antipirética. A AM404 não atua diretamente nos recetores canabinóides, é um ativador potente do recetor TRPV1 (transient receptor potential cation channel subfamily V member 1), o qual é um ligando do recetor canabinóide 1 (CB1) e inibe o uptake celular de anandamida, um neurotransmissor canabinóide endógeno, levando a um aumento dos níveis de canabinóides endógenos. O uptake de anandamida resultaria na ativação de nocicetores. Os canabinóides produzem também efeito antinocicetivo por inibição das vias descendentes, essencialmente através de recetores CB1. Os canabinóides diminuem a temperatura através da ativação de recetores CB1 no hipotálamo.

Apesar de os mecanismos de toxicidade do paracetamol estarem bem estabelecidos, o seu mecanismo de ação ainda hoje está por ser elucidado e constitui um motivo de grande debate.

 

Apesar de vários mecanismos terem sido já propostos, nenhum deles refuta os outros, acreditando-se que os efeitos do paracetamol podem mesmo ser devido à contribuição de vários mecanismos de ação.

Fig. 3 - Mecanismo de acção do paracetamol na cicloxigenase

Mecanismo de Toxicidade

Referências:
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  • Anderson, B. J. (2008). Paracetamol (Acetaminophen): mechanisms of action. Pediatric Anesthesia, 18(10), 915-921.

  • Bertolini, A., Ferrari, A., Ottani, A., Guerzoni, S., Tacchi, R., & Leone, S. (2006). Paracetamol: new vistas of an old drug. CNS drug reviews, 12(3‐4), 250-275.

  • Farrell, S. E. (2001). Acetaminophen toxicity.

  • Graham, G. G., & Scott, K. F. (2003). Mechanisms of action of paracetamol and related analgesics. Inflammopharmacology, 11(4-6), 401-413.

  • Pickering, G., Loriot, M. A., Libert, F., Eschalier, A., Beaune, P., & Dubray, C. (2006). Analgesic effect of acetaminophen in humans: first evidence of a central serotonergic mechanism. Clinical Pharmacology & Therapeutics, 79(4), 371-378.

  • Smith, H. S. (2009). Potential analgesic mechanisms of acetaminophen. Pain Physician, 12(1), 269-280.

  • Toussaint, K., Yang, X. C., Zielinski, M. A., Reigle, K. L., Sacavage, S. D., Nagar, S., & Raffa, R. B. (2010). What do we (not) know about how paracetamol (acetaminophen) works?. Journal of clinical pharmacy and therapeutics, 35(6), 617-638.

Como já foi referido, o paracetamol é maioritariamente metabolizado no fígado, onde a sua maior parte é convertida em compostos inactivos por conjugação com àcido glucurónico e sulfúrico, sendo esses conjugados excretados depois pelos rins.

O metabolismo que ocorre via CYP2E1 leva à produção de NAPQI, um metabolito tóxico. Os efeitos tóxicos do paracetamol advêm da NAPQI e não do paracetamol em si, nem nenhum dos seus principais metabolitos.

 

 

Após dosagens terapêuticas de paracetamol, as reservas de glutationa excedem em muito a quantidade necessária para destoxificar a NAPQI formada. Esta reage então com o grupo sulfidrilo da glutationa, produzindo um conjugado não tóxico que é posteriormente excretado pelos rins.

Por outro lado, após uma overdose de paracetamol, o organismo perde a capacidade para fazer a metabolização deste pelas vias principais, aumentando a via do citocromo P450. Assim, a taxa de formação de NAPQI e a sua quantidade irão superar a quantidade de glutationa disponível e a taxa de produção da mesma, causando assim a sua depleção, com consequente acumulação de NAPQI, que induz uma série de eventos que podem resultar em morte celularEstes eventos críticos, e possivelmente até irreversíveis, incluem oxidação de enzimas, destruição de DNA e lesão mitocondrial. Também o aumento da produção de espécies reativas de azoto e de oxigénio podem ser importantes na toxicidade induzida pelo paracetamol, assim como diversos componentes do sistema imunitário ao nível do fígado (células natural killer, neutrófilos, etc.).

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